O Governo Federal mais uma vez comete um erro ao fixar um preço-teto muito baixo para a bioeletricidade no próximo leilão de energia elétrica, marcado para o dia 22/03. A avaliação é da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), que tem como referência o edital publicado na sexta-feira (17/02) pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Nele, o valor estipulado para o leilão desta fonte de energia, produzida a partir do bagaço de cana-de-açúcar, ficará 20% abaixo do que foi em 2011, um claro desestímulo à participação de fornecedores.
No chamado “Leilão A-3 2012,” que contratará energia de novos empreendimentos de geração com início de suprimento a partir de 2015, o preço-teto para a bioeletricidade foi estipulado em R$ 112,00/MWh para a energia de novos projetos eólicos, hidrelétricos e termoelétricas (gás natural e biomassa). Para projetos de ampliação de usinas hidrelétricas existentes e que não entraram em operação comercial, o preço-teto será de R$ 82,00/MWh.
“O preço de referência estabelecido em R$ 112/MWh para a bioeletricidade representa um forte desestímulo para atrair investimentos para essa fonte, tendência que vem ocorrendo desde 2009,” avalia Zilmar de Souza, gerente de bioeletricidade da UNICA. Ele lembra que em 2011, no leilão similar de energia, o preço-teto foi R$ 139 por MWh e o médio final ficou em R$ 102 por MWh. “Nesse nível, a bioeletricidade conseguiu comercializar apenas quatro projetos dos 81 que havia cadastrado, incluindo o leilão de reserva. Agora, a um preço-teto de partida 20% inferior ao ano passado, imagina-se que a bioeletricidade permanecerá desencorajada a ter desempenho diferente do ano passado,” acrescenta Souza.
O gerente da UNICA avalia ainda que, nos valores estabelecidos para o próximo leilão, haverá ainda pouco ou nenhum interesse para as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e termelétricas a gás natural. “Será um leilão exclusivo para a fonte eólica e, eventualmente, alguma hídrica,” prevê Souza.
Renováveis sem política setorial
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) cadastrou 598 empreendimentos para o Leilão A-3 2012, totalizando 25.850 MW de potência instalada. A fonte eólica apresentou 524 projetos, somando 13.180 MW, ou 51% do total em termos de potência instalada. Térmicas a gás natural representam 40% da potência instalada cadastrada, com 26 projetos totalizando 10.344 MW. Já a bioeletricidade apresentou 22 projetos somando 1.042 MW, apenas 4% da potência instalada total cadastrada.
Souza lembra que as fontes renováveis como bioeletricidade, PCHs e a própria eólica carecem de uma política setorial dedicada. “Esses leilões genéricos misturam fontes poluentes com não poluentes. São coisas diferentes, como se você colocasse em um mesmo balaio frutas diferentes. Refiro-me a estágios tecnológicos, benefícios fiscais, regulatórios e custos de financiamento diferenciados, entre outras coisas, de tal forma que esses leilões não podem ser considerados uma política setorial de incentivo para as fontes renováveis,” sentencia Souza. E vai além: “Uma política fundamentada apenas na matriz econômica do preço e leilões genéricos é míope, simplista, desordenada e mostra um pensamento apenas de curto prazo.”
Energia adormecida nos canaviais
De acordo com a EPE, até 2021 o Brasil precisará acrescentar o equivalente a quase oito usinas Belo Monte para atender ao crescimento do consumo nacional. Para Marcos Jank, presidente da UNICA, só a bioeletricidade tem mais de três usinas com essa capacidade adormecidas nos canaviais, já que há um potencial de 15,3 mil MW médios em bagaço e palha da cana de açúcar.
“Mesmo se aproveitássemos plenamente a bioeletricidade, ainda sobraria espaço para as demais energias renováveis: eólicas, PCHs e até para a iniciante energia solar. Precisamos de uma política setorial de longo prazo pré-definida para as energias realmente renováveis e complementares à fonte hídrica,” diz Jank.
Até o fim desta década, o País precisa dobrar a produção da cana de açúcar, saltando das 555 milhões de toneladas colhidas em 2011 para 1,2 bilhão em 2020, o que exigirá mais de 120 novas usinas. “Para que isto ocorra é essencial viabilizar a bioeletricidade nos leilões regulados, pois etanol, açúcar e bioeletricidade são produtos altamente sinérgicos. Se fechamos a porta para a bioeletricidade nos leilões regulados, corre-se o risco de se desestimular também, por exemplo, a tão necessária expansão do etanol no País,” conclui Jank.
Para saber mais sobre a iniciativa do Projeto AGORA para a bioeletricidade, acesse o site www.bioeletricidade.com.