A reportagem ?Deadly Brew?, apresentada na quinta-feira, 24/01, pelo canal Bloomberg nos Estados Unidos e novamente na sexta-feira, 25/01, pelo canal Bloomberg do Brasil, é uma representação irresponsável, fora de contexto e distante da realidade do setor sucroalcooleiro brasileiro na opinião da UNICA, a União da Indústria da Cana-de-Açúcar. A matéria se baseia em casos isolados, dados repletos de erros de fato e alegações sem embasamento. Não surpreende, portanto, que as conclusões sejam inapropriadas e desequilibradas, e não refletem o setor como ele é hoje,? afirma o Diretor-Presidente da UNICA, Marcos Jank.
Trata-se de um trabalho seriamente defasado segundo Jank, omisso ao não abordar os inúmeros avanços nas condições de trabalho e nas relações entre trabalhadores e empregadores no setor, que opta por apresentar os esforços do setor sucroalcooleiro para introduzir a mecanização e eliminar o corte manual da cana de maneira gradual e ordenada como se fosse um problema, e não solução. Ao mesmo tempo, a reportagem se esforça para também criticar a colheita manual.
A Bloomberg parece mais interessada em apresentar imagens impressionantes de um incêndio noturno do que em explicar que é assim que a palha da cana é removida em virtualmente qualquer lugar do mundo onde se colhe cana,? diz Jank. O fato de a colheita brasileira de cana já ter atingido 40% de mecanização não é citado, assim como foi ignorado o protocolo de intenções assinado em 2006 entre a ÚNICA e a Federação dos Empregadores Rurais Assalariados do Estado de São Paulo, que visa recomendar as melhores práticas para as relações de trabalho rural.
O setor não nega que ainda existem problemas, mas é preciso apresentá-los em contexto, algo que a reportagem da Bloomberg não faz pois prioriza exemplos muito distantes das práticas aceitas no setor sucroalcooleiro brasileiro, no que parece ser uma tentativa de insinuar que exceções refletem a realidade do setor como um todo.
Apresentamos abaixo uma lista parcial de informações equivocadas contidas na reportagem:
· É completamente sem fundamento a afirmação de que condições de trabalho vem se deteriorando na medida em que o setor cresce. Como exemplo, no estado de São Paulo, segundo dados do Ministério do Trabalho de 2005 (os mais recentes disponíveis), perto de 95% dos trabalhadores tem carteira assinada, o que posiciona o setor à frente da grande maioria dos setores da economia brasileira nesse quesito. Na média, trabalhadores do setor recebem cerca de dois salários mínimos, uma das melhores médias salariais da agricultura brasileira;
· A reportagem apresenta todos os cortadores de cana como sendo migrantes de estados brasileiros de baixa renda, o que não é o caso em nenhuma região do País. A maioria dos cortadores de cana vive na mesma região em que trabalha;
· O setor sucroalcooleiro brasileiro emprega quase um milhão de trabalhadores, e não 500.000 como afirma a reportagem. Cerca de 400.000 deles são cortadores de cana. No estado de São Paulo, onde se concentram tanto o setor quanto a base de associados da ÚNICA, existem 189.000 cortadores de cana, dos quais 40% são migrantes de outros estados;
· Não existe montante mínimo de cana que um cortador deve produzir por dia. Cortadores tem um valor mínimo diário garantido, independentemente do volume de cana que cortarem. O montante pago ao final do mês é baseado em valores por tonelada cortada, negociados previamente;
· Números fora de contexto podem parecer impressionantes em campanhas políticas, mas não são sinônimo de jornalismo com credibilidade, pois freqüentemente são usados para distorcer o que se está mostrando aos telespectadores. A reportagem menciona números de acidentes que parecem elevados mas estão defasados, e não há referência aos dados mais recentes do Ministério do Trabalho que mostram acidentes no setor em queda, de 11.000 em 1999 para 8.000 em 2005, mesmo com o número total de trabalhadores em ascenção;
· A reportagem também cita um total de mortes defasado e ignora os últimos dados do Ministério do Trabalho, mostrando que em 2005, 17 trabalhadores morreram no local de trabalho ou enquanto eram transportados. O número representa 0,004% dos 414.000 cortadores de cana em atividade no Brasil naquele ano;
· É importante frisar que, ao contrário do que insinua a reportagem da Bloomberg em vários momentos, não existe um só caso no Brasil em que tenha sido confirmada oficialmente uma ligação entre a morte de um cortador de cana e seu trabalho;
· Ao contrário do que afirma a Bloomberg, não há qualquer garantia no acordo sobre etanol assinado entre o Brasil e os Estados Unidos em 2007 que ?garanta que o Brasil será o principal beneficiado? para exportar etanol para os EUA. Não só tal cláusula ou garantia não existe, como as atuais tarifas impostas pelos EUA representam um forte desestímulo à exportação brasileira de etanol para aquele país;
· Não existe ?cana afiada como navalha?, como cita a reportagem. O que é de fato afiado e cortante é a palha, que é queimada para que os cortadores possam realizar a colheita. Aliás, a queima é exigida em acordos coletivos entre trabalhadores e empregadores, pois sem a remoção da palha, não é possível realizar o corte manual.
A UNICA considera inaceitável que uma empresa global de comunicação como a Bloomberg, estabelecida no Brasil há vários anos, onde atua com uma grande equipe de jornalistas, decida apresentar a seus telespectadores uma visão tão distorcida sobre um setor extremamente bem-sucedido da economia brasileira. Setor que recebe cobertura diária dos profissionais da Bloomberg, e com o qual os profissionais da empresa também transacionam diariamente.
Não há explicação razoável para frases do tipo ?carros movidos a sangue humano? ou ?Brasil iniciando sua revolução industrial? serem utilizadas em uma reportagem produzida pela Bloomberg, deixando a impressão que seus profissionais não estão suficientemente informados sobre o que se passa no Brasil, ou mesmo sobre o atual estágio de industrialização do País. Aliás, profissionais da Bloomberg cobrem o Brasil todos os dias, e rotineiramente produzem matérias que desafiam direta e ostensivamente muito do que aparece na reportagem ?Deadly Brew??, conclui Jank.