O setor sucroenergético brasileiro continua em busca de um acordo com o governo chinês em relação à salvaguarda imposta sobre as importações de açúcar a partir de maio do ano passado.
Delegação brasileira (na direita e ao centro) negocia com executivos da associação chinesa da indústria de açúcarAlém de negociar mecanismos que possam atenuar os prejuízos já sentidos pelos produtores do Brasil, representantes da União da indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) também discutiram o papel da indústria de biocombustíveis na China, um dos maiores emissores de gases de efeito estufa (GEEs) do planeta, e com urgente necessidade de fontes de energia limpa.
Em viagem pelo continente asiático entre os dias 9 e 16 de março, o diretor Executivo da UNICA, Eduardo Leão de Sousa, e o presidente do Conselho Deliberativo da entidade, Pedro Mizutani, que também estiveram no Japão para discutir a nova política de importação de etanol naquele país, reuniram-se com executivos chineses do setor de produção e consumo de açúcar. Em pauta, o estreitamento de relações e a ampliação do mercado para os derivados de cana. O ex-presidente da UNICA, Marcos Jank, atual presidente da Aliança Agro Ásia Brasil, organização responsável reforçar a “ponte” entre o empresariado brasileiro e stakeholders da Ásia, também participou das reuniões.
Os encontros realizados com a Associação Chinesa de Açúcar e a Associação de Açúcar de Guangxi, província responsável por 60% da produção açucareira chinesa, fazem parte de um convênio entre a UNICA e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) para promoção dos produtos sucroenergético brasileiros no exterior.
Pedro Mizutani (4º da esq. p/ dir.) ladeado por representantes da associação chinesa da indústria de açúcar de Guangxi e demais integrantes da comitiva brasileiraA atual salvaguarda chinesa inclui uma tarifa adicional para volumes que ultrapassem a cota de 1,9 milhão de toneladas. Nos primeiros 12 meses, a tarifa imposta pela medida tem sido de 95%, caindo para 90% no segundo ano e encerrando 85% no ano subsequente. Até a aplicação desta medida, a tarifa de importação determinada fora da cota era de 50%.
Segundo Eduardo Leão, o Brasil, principal exportador de açúcar para a China até a imposição da medida, tem sido o país mais prejudicado por essa política. Em 2016/2017, os chineses compraram mais de 2,15 milhões de toneladas de açúcar brasileiro. Na safra 2017/2018, por conta da salvaguarda, este número caiu vertiginosamente para 115 mil de toneladas. “Cabe observar que em vez de proteger os produtores locais, tem-se potencializado o contrabando da commodity, que já ultrapassa mais de 2 milhões de toneladas, trazendo prejuízos ao mercado local e internacional como um todo”.
O executivo também afirmou que a UNICA está buscando um acordo que amenize esse prejuízo sob a forma da abertura de uma cota adicional que mantenha a mesma tarifa extra-cota anterior à medida, de 50%. “Já temos avaliações que mostram várias inconsistências entre os argumentos utilizados pelos chineses para a aplicação da salvaguarda e os requisitos legais definidos pela Organização Mundial do Comércio (OMC) necessários para a sua adoção. Assim, esperamos avançar em alguma negociação, caso contrário, não restará outra alternativa a não ser a abertura de um contencioso contra aquele país”, argumenta Eduardo Leão.
Etanol
Ajudar a China a promover o desenvolvimento sustentável por meio do uso de biocombustíveis, como o etanol, foi outro objetivo dos executivos da UNICA em um dos países mais dependentes do petróleo no mundo. Donos de uma frota automotiva gigantesca, grande parte dela movida a combustíveis fósseis (gasolina e diesel), os chineses têm o desafio de descarbonizar o setor de transporte urgentemente. No Acordo de Paris, assinado em 2015, a China comprometeu-se a reduzir a intensidade de carbono de sua economia a partir de 2030, aumentando o uso e produção de energias renováveis e a cobertura vegetal.
Mizutani e Wang Siqiang, diretor Geral da agência chinesa de energia“O governo chinês anunciou um audacioso plano de mistura de 10% de etanol em todo o país, o que poderá representar uma demanda de até 15 milhões de toneladas ao ano até 2020. Pelas conversas que tivemos com a Agência Nacional de Energia e com outros agentes de mercado, no entanto, ficou claro que a prioridade vai ser a utilização dos estoques públicos de milho, boa parte considerada imprópria para o consumo humano e animal, que atinge hoje cerca de 140 milhões de toneladas. A partir daí, deverá haver uma maior diversificação de fontes como a mandioca, sorgo doce para fazer o 2G.
Desde 2001, a China já tem um programa que autoriza mistura de até 10% de combustíveis de origem renovável à gasolina em nove províncias (Heilongjiang, Jilin, Liaoning, Henan, Anhui, Guangxi, Hebei, Shandong e Jiangsu), o que já representa um consumo de cerca de 3 milhões de toneladas/ano.
Projeto
A Apex-Brasil e a UNICA tornaram pública em fevereiro de 2008 uma estratégia para promover a imagem dos produtos sucroenergéticos no exterior, em especial do etanol brasileiro como uma energia limpa e renovável. As duas entidades assinaram um convênio que prevê investimentos compartilhados. O projeto pretende influenciar o processo de construção de imagem do etanol e demais derivados da cana junto aos principais formadores de opinião mundial – governos e meios de comunicação, bem como empresas de trading, potenciais investidores e importadores, ONGs e consumidores.